terça-feira, 23 de março de 2010

A Bahia e A Comunicação em um Governo Democrático



Uma tentativa ousada e pioneira na luta pela democratização da comunicação foi dada na Bahia, n> meados da década de 1980. O Estado da Bahia, no ano de 1986, foi palco de disputas políticas que interromperam o predomínio do grupo político ligado a Antônio Carlos Magalhães no governo. A posse do candidato Waldir Pires (PMDB) no governo do estado criou grandes expectativas entre setores de oposição de reformular a maneira de governar em diversos setores. Dentro dessa oposição, havia o economista, também ligado ao PMDB, Rômulo Almeida, que propôs Grupos de Trabalho para elaborar propostas de governo para os mais diversos setores. Assim se constituiu um Grupo de Trabalho de Comunicação.


Esse Grupo de Trabalho (GT), constituído pela Fundação João Mangabeira (atual Fundação Rômulo Almeida), iniciou suas atividades em junho de 1986 realizando encontros, discussões e diagnósticos sobre a comunicação social no estado. Ao final do processo foi construído um documento: “A Comunicação em um Governo Democrático”, que apresentava propostas concretas de reformulação da política de comunicação estadual.

Othon Jambeiro, doutor em comunicação pela University of Westminster na Inglaterra e professor titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), comenta sobre o processo de articulação do GT:

“eu como coordenador, procurei formar primeiro um núcleo de jornalistas, algumas pessoas do sindicato, outras da academia. E aí começamos a convidar oficialmente, em nome da Fundação João Mangabeira, os empresários de rádio, televisão e jornalistas pra debater. A frequência nunca foi grande, mas alguns foram, como sindicatos, e tentamos ampliar ao máximo o debate. Isso era uma linha, a outra linha era um levantamento através de contatos que se tinha de cada órgão do governo, levantamentos extra-oficiais, um diagnóstico de cada órgão do governo vinculado à área de comunicação.”

Participante do subgrupo A Comunicação na Sociedade, Albino Rubim, pós-doutor em Políticas Culturais pela Universidade de Buenos Aires e Universidade San Martin e também professor titular da UFBA, diz que as propostas objetivavam principalmente: “1. Divulgar as ações do governo, prestando contas à população; 2. Criar dispositivos de auscultar a população, fazendo com que a população fosse ouvida pelo governo e 3. Realizar uma política de desenvolvimento da Comunicação na Bahia, buscando ampliar a diversidade e a pluralidade de fontes de informação e de meios de comunicação no Estado. Portanto, o objetivo era pensar a Comunicação e o papel da Secretaria (de Comunicação) de um modo inovador”.

O diagnóstico da Comunicação Social na época

Os relatos presentes no documento final do GT, apontam sérios problemas na atuação dos órgãos de comunicação do Estado naquele período. “A atual estrutura do setor de Comunicação Social do Estado da Bahia tem claro caráter autoritário, definido pela existência de práticas de natureza antidemocrática, que se efetivam na intervenção abusiva do Estado, na descaracterização cultural, na censura econômica e política e no divórcio em relação às aspirações da sociedade”, assim trata o relatório quando aborda a situação da comunicação no Estado da época.


A estrutura de comunicação, que antecedia o governo de Waldir Pires era composta por uma Secretaria de Comunicação (Secom), Assessorias de Comunicação das secretarias estaduais, IDERB (Instituto de Radiodifusão do Estado da Bahia) (composta por TV Educadora – TVE e Rádio Educadora) e pela Empresa Gráfica da Bahia – EGBA. Segundo o relatório não havia uma política de integração destes órgãos entre si e entre outros organismos do Estado, existia um mal-aproveitamento dos recursos material e humano, além de ser recorrente a superposição de funções.


Uma Secretaria de Comunicação sem política de comunicação definida nem objetivo social claro, é o que aponta também o relatório, afirmando que a Secom servia como um órgão promocional, a serviço da pessoa do governador e que exercia pressão sobre os veículos de comunicação para que publicassem a versão oficial dos fatos. Havia ainda na Secretaria segundo o relatório uma folha de pagamento para funcionários que não trabalhavam. Othon Jambeiro explica qual era a proposta inicial de se pensar um projeto para a Secom: “nós propugnamos que a Secretaria fosse afastada da comunicação do governador, que não deveria ter nada a ver com a sua propaganda pessoal.” Mas Jambeiro diz que essa proposta gerou confusão e foi rejeitada por oposição dentro do GT.


Havia ainda mais problemas em outros órgãos de comunicação do governo como desvio de sinais de transmissão da TVE para TVs privadas e edições jornalísticas da Rádio Educadora que reproduziam informações de outros veículos, com atraso de até dois dias. Analisando o contexto em que estão inseridos, Albino Rubim explica que esses problemas, apesar de serem locais, são provenientes de um processo histórico nacional: “A comunicação é até hoje um dos setores menos democratizados da sociedade brasileira. Ele é basicamente proveniente da ditadura. Isto apesar de existirem movimentos importantes em prol da democratização das comunicações”.


Frustração


Apesar das mobilizações, expectativas e diálogo com o novo governo que assumia, as propostas não foram implementadas. Othon Jambeiro relembra a atitude do governador Waldir e de outros governadores perante as propostas dos movimentos que lutam pela democratização da comunicação: “nenhum deles mudou até hoje, nem o governo Wagner, nem o Waldir, não mudou nada. Waldir disse que não podia, nós fizemos uma audiência com ele, aquele grupo todo pra pressioná-lo. Ele manteve exatamente a mesma coisa, a mesma estrutura. Manteve inclusive os cabides de emprego na Agecom, gente que nunca ia lá, mas continuavam na folha de pagamento recebendo normalmente.


Expectativas democráticas


Rubim acredita que: “falta um movimento social mais consistente e forte sobre o tema. É preciso que os setores democráticos desenvolvam uma maior sensibilidade para a importância da comunicação no mundo contemporâneo, para a sua democracia e para a diversidade cultural. Sem um movimento social forte creio que este tema não terá possibilidade de mobilizar a população e pressionar o governo para a tomada de medidas mais contundentes, como é necessário”.