quinta-feira, 18 de março de 2010

"Amanheceu" reflete sobre violência contra a mulher

Foto: Alberto Gonçalves

Maria é uma costureira que ouve radionovela e música sertaneja todos os dias, enquanto trabalha. Entre uma agulhada e outra, ela se depara com histórias de violência contra a mulher, que engrossam as estatísticas todos os dias e chocam o País devido à frequência com que acontecem e a brutalidade das ocorrências. Mesmo sentindo-se tão solitária e acuada quanto as vítimas, Maria não se cala e, indignada, reflete sobre esse grave problema de saúde pública, que vitima mulheres brasileiras a cada 15 segundos.

Esse é o mote do espetáculo "Amanheceu", que encerrou sua primeira temporada no Espaço Xisto Bahia, na última quinta (11), às 20h. Encenada pela atriz Juliana Bebé, a montagem traz à baila o tema da violência contra a mulher, numa mistura do lúdico com o drama, aliado à uma linguagem acessível. Segundo Juliana, sua personagem nasceu em setembro de 2009, fruto de dois anos e meio de pesquisa sobre gênero. O espetáculo é dirigido por Laura Franco, tem a orientação de Juliana Ferrari e produzido por Cristiane Araújo, Lílian Badu e Carlos Holanda.

Juliana Bebé em cena. Foto: Paloma Ayres

A peça tem por objetivo formar plateia, além de ser simples e popular”, disse Juliana Bebé que, a princípio, pensou em realizar a montagem em dupla, mas as coisas foram mudando até que resolveu atuar sozinha, criando então o seu primeiro solo. Formada em Interpretação Teatral pela Escola de Teatro da UFBA em 2007, Juliana também é produtora cultural, fotógrafa e arte-educadora. Como atriz, já participou de seis curtas e um média-metragem no cinema e de dez espetáculos teatrais, dentre eles o "Cama, Mesa e Banho", que já se apresentou em vários bares de Salvador.

O mundo de Maria. Foto: Paloma Ayres

O cenário reúne a simplicidade e o caráter funcional, retratando a residência da personagem, que tem um cotidiano simples como o de muitas marias. O discurso é pontuado pela coloquialidade dessa mulher tão humilde quanto questionadora, que se informa e se diverte com seu rádio, um dos seus poucos companheiros.

Maria também interage com a plateia, dividindo com ela a admiração pela novela preferida e pelo cantor sertanejo Daniel, além das questões instigantes do seu dia-a-dia. Quando a temática principal vem à tona, a personagem compartilha sua dor e revolta com o público, que não pestaneja em se tornar cúmplice do seu grito de alerta contra as violências (ainda aceitas) das mais variadas formas, sofridas pelas mulheres diariamente. Impossível não traçar um paralelo com a biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, outra Maria que lutou (e luta) bravamente contra o problema e conseguiu propor a Lei 11.340/06, batizada com seu nome, que pune os agressores.

Na trilha sonora de “Amanheceu”, figura uma música de Milton Nascimento, composta especialmente para o espetáculo. Juliana conheceu o compositor em 2008 e, de lá para cá, entre muitas conversas sobre a vontade da atriz de realizar a montagem, surgiu a composição. “A canção apareceu de forma muito natural. Bituca (apelido de Milton Nascimento) é uma pessoa de grande engajamento social e sempre se mostrou intolerante ao tema da violência contra a mulher”, explica Juliana.

Criada em 2007, a peça teve sua estreia no Espaço Casa 29, Largo 2 de julho, entre os meses de novembro e dezembro do ano passado. Graças ao espetáculo e à sua atuação nele, Juliana Bebé é uma das indicadas ao Prêmio Braskem de Teatro, na categoria Revelação. Sem grandes expectativas sobre a premiação, ela já comemora o fato de estar entre os selecionados. “Estou muito feliz com a indicação e acho que os indicados também são muito talentosos e merecedores deste prêmio”, assinala a atriz.

Para os que não puderam ver o espetáculo neste mês, ainda terão uma nova oportunidade. “Amanheceu” estará de volta ao Xisto, nas três primeiras quintas e sextas de abril.

Serviço:

O quê: "Amanheceu"

Onde: Espaço Xisto Bahia - Rua General Labatut, nº 27, Biblioteca Pública, Barris. Tel: (71)3117-6155

Quando: dias 01,02,08,09,15 e 16 de abril (quintas e sextas), às 20 hs

Quanto: R$ 10,00 (inteira) R$5,00 (meia)


Mais sobre violência contra a mulher
: confira uma pesquisa realizada pelo Instituto Avon/ Ibope e supervisionada pelo Instituto Patrícia Galvão.



Paloma Ayres